Perguntas elaboradas aos entrevistados Txai Suruí e Almir Suruí ambos pai e filha e ativistas de Rondônia marcaram a exibição do programa Roda Viva da TV Cultura, na noite de segunda-feira (29). Mas antes o programa começou mostrando um trecho do discurso entusiasta de Txai, única brasileira a falar na COP-26 a líderes de mais de 200 país. “A Terra está falando. Ela nos diz que não temos mais tempo. Não é 2030, ou 2050. É agora”.
A resposta de Almir Suruí, do povo Paiter Suruí de Cacoal em Rondônia foi dada para a pergunta do jornalista rondoniense Iuri Lima, colaborador da Revista Cenarium que questionou o fato do indígena ter sofrido perseguição pelo governo, inclusive sofrendo investigação por parte da PF por declarações contra a Funai. Para Almir, o órgão foi usado como instituição do governo para declarar oposição contra os povos indígenas.
“Nós estamos a frente desse desafio de defender o nosso direito. O Brasil tem de entender que aquele que defende o meio ambiente não é inimigo da população. Aqueles que defendem o meio ambiente sustentável, esses de fato estão lutando pelo futuro do Brasil”, disse.
Txai como sempre usou da segurança ao falar de temas importantes relacionados ao meio ambiente desnudando paradigmas que rodeiam e ao mesmo tempo flagelam os povos indígenas. Destacou o pré-conceito que ela sentiu ao discursar na COP-26 e os efeitos após o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) que lhe acusou de mentir sobre crimes ambientais na floresta amazônica.
“Após o meu discurso e principalmente do posicionamento do presidente, eu recebi muitos ataques racistas, misóginos, de ódio, de que eu não poderia estar ali, de que eu não poderia está falando inglês, que eu não poderia usar o meu celular. Mas a verdade é que os povos indígenas são essenciais para o equilíbrio climático do planeta. É como eu disse no meu discurso, nós temos a solução para reverter essa crise”, declarou Txai.
Sobre as ameaças sofridas, Txai foi enfática e disse que mesmo diante do perigo não vai desistir. “Eu não tenho medo. Até porque o que a gente passa dentro do nosso território quem é indígena sabe, é muito pior do que mensagem de ódio na internet. As ameaças contra a nossa vida vão continuar independente do que a gente faça”, declara.
O cenário atual com populações indígenas sendo dizimadas pelo Brasil numa outra guerra 500 anos ao descobrimento, para Txai Suruí é um problema gravíssimo de omissão por parte do governo federal. A fome e morte de indígenas do povo Yanomami foi um exemplo.
“Aquilo ali é um ataque aos direitos humanos, são crianças desnutridas que tem toda uma população sendo envenenada”, denuncia.
Txai que também destacou seu povo em Rondônia com a perda de parentes para a Covid-19. “O que estamos vendo não é apenas uma omissão por parte do governo, mas também um incentivo a invasões e um ataque aos nossos direitos, principalmente por parte do Legislativo com o Marco Temporal e a PL-490 que são projetos de lei que querem acabar com as terras indígenas”, explica.
Questionada do peso que foi representar as mais de 305 etnias indígenas e sendo a única representante brasileira com voz na COP-26, Txai lembrou que mesmo um evento que tem como objetivo alertar aos dirigentes do planeta para causas que afetam toda uma comunidade como a COP ainda é algo de segregação.
“Levamos a maior delegação indígena dos povos na história das COP, com mais de 40 líderes presentes. Como ainda o movimento negro com a coalização direito. Estamos lá para dizer exatamente isso, que esses espaços já não podem mais acontecer sem a nossa presença”, lembra.
Sobre o projeto Carbono florestal em que o povo Suruí foi vanguardista em Rondônia e no mundo, há mais de 15 anos, Almir esclarece que por enquanto está parado, o interesse de não indígenas estaria atrelado em não deixa avançar o programa. “Simplesmente o desmatamento em Rondônia acabou com o projeto”.
A tecnologia em favor da liberdade e das denúncias. “Os povos indígenas podem estar onde eles quiserem, pois nós ainda somos muito invisíveis. Grettar (Trunberg) é uma menina branca europeia falando de assuntos no norte global e nós não temos a mesma visibilidade”, esclarece.
O resultado da entrevista pode ser avaliado como mais um carimbo comprobatório das mazelas que hoje tem passado a Amazônia brasileira.
“Assistimos estarrecidos ao avanço de ameaças como o desmatamento, queimadas, garimpo ilegal, invasões de terra indígenas e grilagem na Amazônia e em outros biomas brasileiros. Esses retrocessos civilizatórios que são humanos e ambientais já nos cobram um preço alto diante do resto do mundo. Ouvir as vozes daqueles que vivem na pele ao longo de séculos essa violência contra o seu povo e a sua casa é uma chance que temos de juntos com eles brigar para estancar essa sangria que ameaça não só a existência deles, da floresta e das espécies que lá habitam, mas de toda a humanidade”, finalizou a mediadora do programa Vera Magalhães.