Por Núbia L. S. Sussuarana
O surgimento da cidade de Porto Velho se deu em ocasião da construção da Estrada de Ferro Madeira-Mamoré. Em 2 de outubro de 1914 foi legalmente instituída como um município do Amazonas, transformando-se em capital do estado de Rondônia em 1943, quando criou-se o Território Federal do Guaporé.
O nome é originário de um antigo porto localizado nas proximidades da Estrada de Ferro que, segundo pesquisadores, pertencia a um senhor idoso, ao que se sabe, se chamava Pimentel. Por ser um ponto de referência para navegantes do rio Madeira aportarem, o local ficou conhecido como Porto do Velho. Com o passar do tempo, esta palavra sofreu uma variação histórica (metaplasmo) resultando hoje em Porto Velho.
Diante do exposto, entendemos que o sentido simbólico que se manifesta no imaginário de qualquer ser social levando em consideração suas experiências culturais sincrônicas e diacrônicas, traduz sentimentos em relação a espacialidade e memórias. Assim, entender o povo de Rondônia se faz necessário um percurso em sua geo-história; seus rios, matas, processos migratórios, monumentos históricos e principalmente a todo significado que permeia o complexo ferroviário que impulsionou a formação do Estado, a EFMM. Há que considerar os personagens envolvidos na idealização, construção e funcionamento da estação, heróis desconhecidos ou visibilizados. Que ao comemorar a inauguração do empreendimento ferroviário, esquecemo-nos que este, foi feito por pessoas.
O Tratado de Petrópolis selado entre Brasil e Bolívia em 17 de novembro de 1903, no qual, o Brasil pôde comprar o território em disputa com a Bolívia – hoje estado do Acre – compromete o Brasil, em um de seus artigos, a construção de uma ferrovia que favorecesse o escoamento das produções bolivianas.
É assim, surge a lendária Madeira-Mamoré, empreendimento para o Brasil e vantagem comercial para a Bolívia que estava sem passagem para transportar seus produtos devido o fechamento da rota anterior que era pelo Chile. A Ferrovia surgiu para facilitar o transporte de cargas no perímetro encachoeirado do rio Madeira. A contrapartida seria a resolução da “Questão do Acre”. Por isso, justamente na parte navegável é que funda-se a estação final da ferrovia sendo que a inicial, foi construída na fronteira, em Guajará-Mirim, cidade que também tem sua fundação marcada pelas atividades da estação.
A partir deste ponto, do “Porto do Velho”, as cargas poderiam ser embarcadas e seguir em viagem via fluvial pela rota de comércio pretendida pela Bolívia, Beni-Madeira-Amazonas e Atlântico. Era o caminho mais rápido para alcançar o comércio europeu e dos estadunidenses.
Percival Farqhuar (1864-1953), foi um dos responsáveis pela construção do empreendimento que se deu de 1907 a 1912. Colocando em ação a Madeira-Mamoré Railway Co; Muitos trabalhadores morreram no período da obra devido à insalubridade, fome, doenças tropicais como malária e disenteria, falta de medicamentos, ataques dos indígenas, somado às condições de trabalho insalubres e periculosas a que foram submetidos. A rotatividade de operários era tão grande, devido as mortes, que foi necessário a construção de um hospital e um cemitério para atender a grande demanda.
A movimentação migratória de trabalhadores vindos de vários países para o trabalho braçal deste ousado e moderno empreendimento, desencadeou o surgimento do município de Porto Velho e a partir deste, o estado de Rondônia. Por isso, o ex ferroviário Manoel Soares que trabalhou por mais de 50 anos na fase mais recente do funcionamento da Ferrovia, disse em vida:
Manelão, como era conhecido, pertencia ao grupo dos novos ferroviários, pilotou várias máquinas na estação, mas a que mais viajou sobre sua condução foi a máquina 18.
A assertiva do ferroviário corrobora com a pesquisa dos historiadores locais que acreditam ter existido um porto, conhecido simplesmente como, Porto do Velho, onde instalou-se a estação de chegada da Estrada de Ferro.
Autora: Núbia L. S. Sussuarana, Mestra em Letras, membra do Grupo de Estudos de Cultura e Modos de Vida Amazônicas – Gepcultura/Unir. Professora de História e Libras. Autora dos livros: Metaplasmos na Libras; Amazônia pelos Amazônidas e Sinais para Conhecer Rondônia, História, Cultura e Libras.