As armadilhas conceituais que o cérebro nos faz cair são impressionantes. Isso porque a quantidade de filtros que temos principalmente em nossos olhos alteram consideravelmente a compreensão da realidade. E não se trata apenas das questões ligadas à quantidade de luz, foco, nitidez e cenário, mas também a preconceitos, prejulgamentos e predisposições. Além de terem em comum o sufixo "pre", que indica algo anterior e antecipado, essas palavras geram pensamentos e ações desacertadas e danosas à pessoa, ao outro e ao contexto.
Ele se manifesta muitas vezes sutilmente, quase imperceptível, quando nos referimos ao outro de forma desfavorável, sem conhecimento, sem ponderação, sem razão. É a generalização do outro, baseada apenas numa experiência pessoal ou imposta pelo meio em que se vive. Daí surgem a intolerância, o rótulo, a indiferença, a hostilidade – geralmente contra negros, mulheres, homoafetivos, estrangeiros, índios, nascidos em outros estados, e até contra quem adota uma política ou religião diferentes.
Outro filtro nocivo é o prejulgamento: se o outro tem tais características, então só pode ter tal comportamento e tem que merecer isso. Agimos como juiz e carrasco da vida alheia. Sem nenhum pudor, decidimos que o outro (tão diferente!) não é bem-vindo em nosso convívio pessoal, familiar e social, sentenciando-o ao isolamento, esquecimento, apartheid, perseguição, indiferença, gueto, periferia, sumiço nas redes digitais. Isso sem esquecer outras formas de violência, como a difamação, calúnia, assédios, até chegar à tortura, fuzilamento e condenação ao quinto dos infernos. Infelizmente, passamos a ver o outro não mais como coparticipante na construção do mundo em todos vivemos, e o rotulamos como inimigo a ser destruído.
Isso acontece porque nos deixamos levar pela predisposição adquirida desde a infância. Em nossa formação contínua, aprendemos com os pais, professores, líderes religiosos, parentes, amigos, filmes, músicas, vizinhos, piadas, livros, novelas, tradições, e também com as alegrias, decepções, perdas, conquistas, injustiças, prêmios, presenças, ausências, dores e luto – como se fossem peças de um imenso quebra cabeça que pode nos levar ao convívio salutar entre pessoas diferentes, ou a preconceitos e prejulgamentos nocivos ao bem-estar pessoal, ambiental e espiritual.
Certa vez, Jesus alertou: tire a trave que está no seu olho, antes de notar o argueiro no olho do outro (Mateus 7.5). É impressionante essa hipérbole, pois uma madeira grossa e grande, se colocada perto dos olhos, impede a visão e leva o cérebro a conclusões precipitadas (outra palavra com "pre"). Arrisco a dizer que basta a falta de respeito ao outro para que tudo isso ocorra. Leis, códigos, constituições e todo acordo pode ser resumido no respeito mútuo que deve existir nas relações interpessoais, com o meio ambiente e com Deus. Uma questão de corrigir nosso olhar de cada dia.