Moisés Selva Santiago
Há quase duzentos anos, a humanidade adotou um sinal de pedido de socorro com três pontos, três traços, três pontos. O Código Morse, assim, seria reconhecido mundialmente. Uma incalculável quantidade de vidas continuam sendo resgatadas por causa desse sinal usado também no piscar de luzes e na batida de qualquer objeto, nessa sequência. A partir dos anos 1920, passou-se a usar a expressão mayday, originada do francês venez m'aider, dita três vezes para significar venha e me ajude, help me, socorra-me!
O fato é que ameaça, insegurança, perigo e medo fazem parte de nossa passagem por esse planeta, desde as origens da história. Quando essas situações chegam e desnudam nossa fragilidade, há os que se petrificam e viram colunas de sal, como a mulher de Ló. Ficam imóveis "com a boca escancarada cheia de dentes, esperando a morte chegar", como cantou Raul Seixas. Pessoas assim condicionam o salvamento exclusivamente à ajuda externa. Inoperantes e alheias, sofrem a dependência total do outro e essa falta de ação sai da esfera do espanto e alcança o limite de um fim indesejado.
Existem os que podem e gritam mayday. Também desejam ser salvos. Vemos nos filmes o desespero do piloto na aeronave que não mais se sustenta no ar. Figurativamente, mayday é o pedido egoísta: "Eu preciso ser salvo. Eu mereço ser salvo. Eu quero ser salvo, preferencialmente antes dos demais." Um anseio baseado na ideia de que cada um cuide de si mesmo e Deus cuida de todos, vivenciado pelo personagem Cal Hockey, noivo de Rose no filme "Titanic". Mas, mesmo para um piloto sozinho, mayday implica num pedido de socorro coletivo, pois a morte de uma só pessoa atinge familiares, amigos, colegas, vizinhos, compatriotas e as gerações futuras. Imagine o imenso estrago emocional e social causado pela morte de centenas, milhares, milhões de mulheres e homens.
Finalmente, diante do perigo há os que agem rapidamente, batem e piscam e gritam SOS. Anunciam com urgência save our soul, save our ship. Sim, pedem ajuda externa porque entendem a solução como a união da vontade, esforço e recurso de quem necessita e de quem pode ajudar. Como aquele cego que se levantou e pediu a Jesus para enxergar. Pessoas assim fazem sua parte na luta pela preservação da vida – pessoal e coletiva. Sozinhas num apartamento (talvez por conta do isolamento social) ou com outras pessoas num navio ou à mesa na hora da oração, o que elas querem é a vida para todos.
Por isso, esse é o tempo de pedirmos SOS. E fazemos isto quando usamos corretamente a proteção individual nas pandemias, para minimizar o poder do invisível inimigo de todos. Quando decidimos votar somente em candidatos comprometidos com o bem-estar do Brasil como estado democrático de direito. Quando nossa solidariedade reparte o pão e o afeto a quem está perto ou longe. E quando nossa fé extrapola templos e alcança os corações dos aflitos, dos que sofrem bem mais do que nós. E tudo isso sem esquecer que o melhor e mais poderoso pedido de SOS está sempre na primeira pessoa do plural: salve nosso navio, salve nossa vida!