Terça-feira (25) à noite li nas redes sociais a notícia da morte do Roberto Brega, um sonhador. Seu maior desejo: gravar um CD. E o segundo maior, talvez fosse ser agraciado pelo programa do apresentador de TV Luciano Huck, no quadro Lata Velha, onde teria seu fusca azul restaurado.
Um tempo atrás, acho que há quase três anos, fiz uma entrevista com ele lá na avenida Amazonas, no Agenor de Carvalho, próximo ao local em que ele então morava. Por algumas vezes tentei produzir um texto, mas sempre esbarrava em algumas dificuldades, a primeira delas, foi que realmente não consegui extrair dele clareza nas informações. Às vezes me parecia um homem enigmático, mas de outras vezes, a impressão que eu tinha é que lhe faltava lucidez para concluir frases e pensamentos. Mas agora, diante da notícia de sua morte, retomei às escassas anotações e tento extrair delas alguma coisa que faça sentido. Por algumas vezes, tentei retomar a entrevista, mas sempre que o via em algum cruzamento, ou estava apressada ou pensava que não era um bom momento.
Mas enfim, a vida passa para todos e passou para o Roberto Brega, que na verdade se chamava José e ao ser questionado pelo sobrenome, ele alegou que todo mundo conhecia ele pelo nome artístico, e não havia necessidade de mais informações. Adotou o nome de Roberto, porque muitos fãs diziam que a sua voz era muito parecida com a do cantor popular Roberto Carlos e o brega, certamente era por causa da linha musical que adotara. Ainda assim disse que tinha filhos, cinco no total e sete netos e que conversava, por telefone, com alguns deles de vez em quando.
Brega contou então que a partir de um momento de sua vida, não definido claramente, passou a perseguir o sonho de ser cantor. Lembrou que quando tinha uns 10 ou 11 anos aprendeu a tocar violão. Com essa ideia, há alguns anos, deixou o Recife excursionando até o Amazonas. Passou por cidades como Nova Olinda do Norte e Santo Antônio do Borba. Na bagagem tinha um único CD gravado, e por onde passava pleiteava algumas cópias para vender ao público. Contou que viajou de avião e de ônibus com ar condicionado e que fazia shows ao vivo, mas aos poucos foi perdendo o que ganhava e por fim ficou sem a caixa de som e o teclado. Foi quando ouviu falar que talvez tivesse sorte em Rondônia, aonde chegou com 20 reais no bolso.
Passou por Guajará Mirim, onde pensava comprar um novo teclado, para depois se estabelecer em Porto Velho. Saudoso, lembrava-se de ter tocado em um bar na Avenida Sete de Setembro, e outro no bairro da Balsa. A música principal de seu repertório, segundo ele mesmo, era “Mulher Vaidosa”, que o público sempre pedia bis. Passou dois anos morando no fusca 1973, azul, o mesmo que nos últimos anos tentava, a todo custo, que fosse reformado no quadro Lata Velha, do Luciano Huck.
Quanto ao fusca, Brega relatou que enquanto não conseguia a reforma global, alguns amigos tinham mandado para uma oficina em Porto Velho e que ele esperava em breve ter o seu carro de volta. Mas na verdade ele não tinha muita certeza sobre isso, pois se mostrava confuso quanto ao destino do antigo veículo.
O único CD que conseguiu gravar foi uma matriz e sonhava com a sua reprodução e distribuição em muitos pontos de vendas. Passados os anos e sem condição nenhuma de se apresentar, Brega passou a depender da caridade popular. O cartaz, anunciando seu show estava surrado, rasgado e sujo. Suas vestes gastas também despertavam compaixão, mas ele não abandonava o estilo Roberto Brega de se vestir. Os cabelos emaranhados e a longa barba estavam incorporados ao seu estilo. Pessoalmente, não me lembro desde quando ele estava em Porto Velho e acho que nem ele se lembrava, pois sempre que falava sobre este tema ele abordava outro assunto. Talvez haja em nossos jornais matérias informativas desse tempo, mas agora não tenho como verificar.
Bom seria se houvesse apenas este Roberto Brega, mas nossas cidades estão cheias de homens e mulheres que se perdem diariamente em sonhos, que para a maioria são inatingíveis. Alguns ficam na ilusão, outros apelam para as drogas, outros enfermam com a depressão. Cada um busca a sua válvula de escape. Brega chamou a atenção de muitos, mas poucos olharam para ele de verdade, e eu me incluo nestes muitos. É provável que logo tenhamos outros Bregas nos semáforos de nossa cidade, aliás, acho que já temos. A maioria ainda é jovem, mas o tempo passa rápido e o fim de muitos talvez seja o de uma morte solitária em um canto qualquer. Acho que vale pensar em algo que possamos fazer.